- Em primeiro lugar, diz que será um rei dos pobres, um pobre entre os pobres. A pobreza entende-se neste caso no sentido dos «anawin» de Israel, dessas almas crentes e humildes que vemos ao redor de Jesus, na perspectiva da primeira bem-aventurança do Sermão da montanha. Pode-se ser materialmente pobre, mas ter o coração cheio de ânsia de riqueza e do poder que deriva da riqueza. O facto de que vive na inveja e na avareza demonstra que, em seu coração, forma parte dos ricos. Deseja tocar a repartição dos bens, mas para que ele mesmo encontre-se na situação que antes ocupavam os ricos. A pobreza no sentido de Jesus --no sentido dos profetas-- pressupõe sobretudo a liberdade interior da avareza e do afã de poder. Trata-se de uma realidade maior que uma repartição diferente dos bens, que se limitaria ao campo material, e que faria ainda mais duros os corações. Trata-se, antes de tudo, da purificação do coração, graças à qual se reconhece que a posse é responsabilidade perante os demais, e se deixa guiar por Cristo que, sendo rico, fez-se pobre por nós (Cf. 2 Coríntios 8,9). A liberdade interior é o pressuposto para superar a corrupção e a avareza que a estas alturas devastam o mundo; esta liberdade pode encontrar-se só se Deus converte-se em nossa riqueza; só pode encontrar-se na paciência das renúncias cotidianas, nas quais se desenvolve como liberdade autêntica. No Domingo de Ramos aclamamos o rei que nos indica o caminho para esta meta, Jesus, e lhe pedimos que nos leve consigo em seu caminho.
- Em segundo lugar, o profeta mostra-nos que este rei será um rei da paz: fará que desapareçam os carros de guerra e os cavalos de batalha, romperá os arcos e anunciará a paz. Na figura de Jesus, isto se concretiza com o sinal da Cruz. É o arco quebrado, em certo sentido o novo, o autêntico arco-íris de Deus, que une o céu e a terra e estende pontes entre os continentes sobre os abismos. A nova arma que Jesus põe em nossas mãos é a Cruz, sinal de reconciliação, sinal do amor que é mais forte que a morte. Cada vez que nós fazemos o sinal da Cruz, temos de nos lembrar de não responder à injustiça com outra injustiça, à violência com outra violência; temos de nos lembrar de que só podemos vencer o mal com o bem, sem oferecer mal por mal.
- A terceira afirmação do profeta é o pré-anúncio da universalidade: o reino do rei da paz estende-se «de mar a mar... até os confins da terra». A antiga promessa da Terra é substituída aqui com uma nova visão: o espaço do rei messiânico já não é um país determinado, que se separaria dos demais, e que inevitavelmente tomaria posição contra os demais países. Seu país é a terra, o mundo inteiro. Superando toda delimitação, na multiplicidade das culturas, cria unidade. Penetrando com o olhar nas nuvens da história, vemos aqui como emerge desde longe na profecia a rede das comunidades eucarísticas que abraça todo o mundo, uma rede de comunidades que constituem o «Reino da paz» de Jesus, de mar a mar até os confins da terra. Ele chega a todas as culturas e a todas as partes do mundo, por toda parte, às miseráveis cabanas e aos pobres povoados, assim como ao esplendor das catedrais. Por toda parte ele é o mesmo, o Único, e deste modo todos os orantes reunidos, na comunhão com ele, estão unidos também entre si em um único corpo. Cristo governa fazendo-se nosso pão e entregando-se a nós. Deste modo constrói seu Reino. Este nexo se resulta totalmente claro em outra frase do Antigo Testamento que caracteriza e explica o sucedido no Domingo de Ramos. A multidão aclama Jesus: «Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor» (Marcos 11, 9; Salmo 117[118], 25s). Esta frase forma parte do rito da festa das cabanas, durante a qual os fiéis se movem em torno do altar, levando nas mãos ramos de palma. Agora as pessoas lançam este grito ante Jesus, em quem vê aquele que vem no nome do Senhor: a expressão: «O que vem em nome do Senhor», de fato, havia-se convertido na maneira de designar o Messias. Em Jesus reconhecem a quem verdadeiramente vem no nome do Senhor e traz a presença de Deus entre eles. Este grito de esperança de Israel, esta aclamação a Jesus durante sua entrada em Jerusalém converteu-se com razão na Igreja na aclamação a quem, na Eucaristia, sai ao nosso encontro de uma maneira nova. Saudamos a quem na Eucaristia sempre chega entre nós no nome do Senhor unindo na paz de Deus os confins da terra. Esta experiência da universalidade faz parte da Eucaristia. Dado que o Senhor vem, nós saímos de nossas realidades exclusivistas e passamos a formar parte da grande comunidade de todos os que celebram este santo sacramento. Entramos em seu reino de paz e aclamamos nele em certo sentido nossos irmãos e irmãs, por quem vem para criar um reino de paz neste mundo lacerado. As três características anunciadas pelo profeta --pobreza, paz, universalidade-- estão resumidas no sinal da Cruz.
Por este motivo, e com razão, a Cruz converteu-se no centro das Jornadas Mundiais da Juventude. Houve um período --e não ficou totalmente superado-- no qual se rejeitava o cristianismo precisamente por causa da Cruz. A Cruz fala de sacrifício, dizia-se, a Cruz é sinal de negação da vida. Nós, contudo, queremos a vida inteira, sem restrições e sem renúncias. Queremos viver, nada mais que viver. Não nos deixamos limitar pelos preceitos e as proibições --dizia-se e se continua dizendo--; queremos riqueza e plenitude. Tudo isto parece convincente e sedutor; é a linguagem da serpente que nos diz: «Não vos deixeis atemorizar! Comei tranqüilamente de todas as árvores do jardim!».
O domingo de Ramos, contudo, diz-nos que o autêntico grande «sim» é precisamente a Cruz, que a Cruz é a autêntica árvore da vida. Não alcançamos a vida apoderando-nos dela, mas dando-a. O amor é a entrega de nós mesmos e, por este motivo, é o caminho da vida autêntica simbolizada pela Cruz.
Hoje se entrega a Cruz que foi o centro da Jornada Mundial da Juventude em Colônia a uma delegação para que comece seu caminho para Sydney, onde em 2008 a juventude do mundo quer reunir-se de novo ao redor de Jesus para construir junto a ele o reino da paz. De Colônia a Syndey, um caminho através dos continentes e das culturas, um caminho através de um mundo lacerado e atormentado pela violência! Simbolicamente é como o caminho de mar a mar, desde o rio até os confins da terra. É o caminho de quem, com o sinal da Cruz, entrega-nos a paz e faz de nós portadores de sua paz. Agradeço os jovens que levarão pelos caminhos do mundo esta Cruz, na qual quase podemos tocar o mistério de Jesus. Peçamos-lhe que ao mesmo tempo abra nossos corações para que, seguindo sua cruz, convertamo-nos em mensageiros de seu amor e de sua paz. Amém.